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Sindicarne - Goiás

Hoje tem espetáculo

Em toda cidade do interior de vez em quando aparece um “pára-quedista”. É aquele sujeito que ninguém sabe de onde veio, o que veio fazer, se entrosa rápido com todo mundo, namora nossas moças, bebe das nossas cervejas, enfim, fica amigo de todos. Uns acabam ficando. Outros vão embora do mesmo jeito que surgiram.

Em Catalão, no começo dos anos 60, apareceu um sujeito desses. Estatura média, cor parda, gostava de vestir um terno branco de linho, tocava bem e tinha uma sanfona 120 baixos. Para se deslocar, pilotava um motor desses antigos de dois tempos – um BSA. Chamava-se Divino e era muito vaidoso e apressado. Tocava em bailes nas roças, casas de família na cidade e até na zona.

Quando estava mostrando seu talento musical, esboçava um sorriso forçado somente para mostrar uma “carreira” de dentes de ouro. Com ele não tinha tempo ruim. Seu negócio era festa e um bom visual. Não sei por que, mas acabou ganhando o apelido de Divino Isbafurida – talvez pelo seu jeito esbaforido de ser.

Na vizinha cidade de Ouvidor arrumou uma namorada. Menina nova, de família sistemática e muito bonita. Divino Isbafurida chamou a moça para irem a um circo na cidade. Ela se recusou, dizendo que não andava sozinha com namorado. Divino sugeriu, então, que ela convidasse a mãe e os irmãos. Lá foram eles para o espetáculo. Isbafurida, eufórico, comprou ingresso para todos, inclusive balas e pipoca. Era o dono da situação.

Já dentro do circo, subiram para a última tábua da arquibancada. Lá em cima, esnobou: sacou dois lenços, forrou um para a namorada sentar-se e outro para ele não sujar o impecável terno branco de linho. Parte da platéia ficou estática com tanta gentileza e grã-finagem do Isbafurida.

Uma vez acomodados, arrancou do bolso um maço de cigarros, acendeu um, cruzou as pernas, deu uma profunda tragada e, na última tábua da arquibancada, resolveu se escorar. A lona do circo fugiu de suas costas e Divino Isbafurida murchou no chão. Na mesma toada que caiu, rolou-se por baixo da maldita lona que lhe derrubou. O terno, que era branco, estava marrom de poeira.

Quando Isbafurida levantou-se, deu de cara com um grupo de capiaus. Um deles comentou:

– Uai, óia só! Esse circo parece qui num é dus ruim não. Tá até derramano gente de tão cheio, né?

Um outro arrematou:

– O mágico também é bão, muda até a cor da rôpa da gente. Óia o terno desse cabôco. Era branco, agora tá marrom…

Os caipiras entraram para o circo e Divino Isbafurida saiu pra rua e não voltou mais a Ouvidor.

FalaCaipira

Luiz Carlos Rodrigues – Jornalista